sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

ATIVIDADE FÍSICA NA GESTAÇÃO

(Por: Eduardo Rohrs)

Para falarmos sobre atividade física na gestação, inicialmente devemos compreender um pouco a respeito do desenvolvimento embrionário, isto é, estudar a respeito da embriologia.
Como o próprio nome diz, embriologia, é o ramo da biologia que estuda o desenvolvimento embrionário.
Este ramo da biologia é subdividido em quatro etapas:

1ª Etapa – Fecundação ou Fertilização:

É a etapa em que ocorre a penetração do espermatozoide no ovócito II ou ovócito secundário.
Ovócitos são células germinativas femininas ou células sexuais produzidas nos ovários. Resultam de um processo fisiológico denominado ovogênese, durante este processo formam-se dois tipos de ovócitos:
Ovócito I ou Ovócito primário à Ocorre ainda durante a vida intra-uterina (célula diplóide);
Ovócito II ou Ovócito secundário à Célula formada a partir da meiose I (divisão I da meiose) de um ovócito I, durante a fase de maturação da ovogênese (célula haplóide).
Após a penetração do espermatozoide no ovócito II, este por sua vez, passa a ser chamado de Óvulo.
A penetração de apenas um espermatozoide no óvulo chama-se monospermia, já a penetração de mais de um espermatozóide no óvulo chama-se poliespermia. Caso haja o processo denominado de poliespermia, apenas o primeiro espermatozóide irá fecundar o óvulo.
Após a penetração do espermatozoide no óvulo, ocorre a união do pró-núcleo masculino (núcleo do espermatozoide) com o pró-núcleo feminino (núcleo do óvulo). Essa união pode ser denominada de anfimixia ou cariogamia ou singamia.
Habitualmente essa união ocorre no primeiro terço externo das Tubas Uterinas (Trompas de Falópio).

2ª Etapa – Clivagem ou Segmentação:

É o processo específico de divisão celular equacional (mitose). A célula-ovo (zigoto) sofre sucessivas divisões originando células menores chamadas blastômeros.
Os mamíferos possuem a segmentação do tipo holoblástica igual, ou seja, as células são do mesmo tamanho e o zigoto se divide completamente.
Após três dias a fertilização é formada a mórula, por um processo conhecido como morulação (Morulação = Zigoto è Mórula). A mórula é o primeiro estado de desenvolvimento do embrião, depois do zigoto começar a dividir-se para formar uma esfera com 64 células, ou blastômeros.
O zigoto com 12 a 16 blastômeros já pode ser chamado de mórula. A mórula leva de 3 a 7 dias para sair das tubas uterinas e chegarem ao útero através dos movimentos ciliares e peristálticos das tubas. Um dia após a chegada da mórula ao útero ela transforma-se em blástula.

3ª Etapa – Gastrulação:

É a transformação da blástula em gástrula. Ocorre alteração no volume, aumento do volume total do “ovo”, formação dos folhetos embrionários (ectoderma, endoderma e mesoderma), formação do arquêntero ou intestino primitivo e formação do blastóporo (dará origem ao ânus).
É na gastrulação que começa o processo de diferenciação celular e é também onde as células vão adquirindo posições e funções biológicas específicas.

4ª Etapa – Organogênese:

É a fase em que ocorre a diferenciação dos folhetos em órgãos.
Inicia-se com a neurulação (formação do tubo neural a partir da ectoderme), formação da notocorda (estrutura de sustentação, que será substituída pela coluna vertebal) e formação do celoma, delimitado pela mesoderme.


Sendo assim, após conhecermos os principais processos de formação do embrião, para darmos início as atividades físicas para gestantes, devemos também ter em mente algumas alterações que ocorrem no organismo materno.

Modificações no Organismo Materno

Algumas mudanças iniciam-se desde o momento da fecundação e se estendem por todo o período gestacional até o término da lactação. São ajustes fisiológicos e anatômicos.
As principais alterações sistêmicas são:
  • Alongamentos das fibras musculares;
  • Aumento do abdômen;
  • Aumento da caixa toráxica;
  • Pressão pélvica;
  • Elevação do volume sanguíneo total em cerca de 40 a 50%, como decorrência do aumento tanto do volume plasmático quanto da massa total de eritrócitos e leucócitos na circulação.
  • Hemodiluição / Anemia fisiológica. Do ponto de vista fisiológico, a anemia poderia ser definida como um estado de deficiência de hemoglobina no sangue circulante para o transporte do oxigênio requerido para a atividade fisiológica de um indivíduo (no caso, da gravidez).
  • O débito cardíaco se eleva a partir da 12ª semana de gestação, com pico entre a 28ª e a 32ª semana. Aproximadamente 30 a 50% acima dos valores em mulheres não gestantes (geralmente de 4500 para 6000 ml/min em repouso);
  • Elevação da frequência cardíaca materna. De 10 a 15 bpm acima dos valores em mulheres não gestantes (geralmente de 70 para 85 bpm em repouso).
  • Aumento no volume sistólico. Em média de 60-70 ml para 85-90 ml por batimento cardíaco.
  • Aumento do consumo de oxigênio. Em média de 14%.
  • Redução da resistência periférica;
  • Redução da Pressão Arterial Sistólica. Em média de 3 a 5 mmHg.
  • Redução da Pressão Arterial Diastólica. Em média de 5 a 10 mmHg.
  • Alterações urogenitais.
No primeiro trimestre de gestação o útero acentua seu crescimento, devido à hipertrofia das células musculares lisas, ao aumento da quantidade de tecido elástico, além do aumento do número e tamanho dos vasos sanguíneos.
Aproximadamente na segunda metade do período gestacional, o crescimento do volume uterino se mantém, porém as paredes miometriais se tornam mais finas. É comum nesta fase contrações indolores e de baixa intensidade (Contrações de Braxiton Hicks), refletem o crescimento e a vascularização do útero.
Os ligamentos uterinos tornam-se alongados e hipertrofiados, protegendo o feto de bactérias e traumas mecânicos, estabilizando o útero.
As alterações das mamas são quase sempre os sinais mais precoces da gravidez;
  • Aumento da sensibilidade;
  • Aumento do volume (a partir da 8ª semana)
  • Aumento do suprimento sanguíneo.
  • A aréola escurece e forma pequenas pápulas palpáveis que consistem na hipertrofia das glândulas sebáceas;
  • Após a 10ª semana o colostro (percursor do leite materno humano) já está presente e pode ser expelido se a mãe realizar uma compressão suave na mama.
Além destas modificações no organismo materno, também ocorrem modificações posturais, essas por sua vez possuem enorme importância, para muitas das queixas de dores musculares das futuras mamães.
Uma das principais causas responsáveis pelas alterações posturais são as alterações hormonais, estas afetam particularmente o sistema musculoesquelético, que sofrem embebição gravídica (aumento fisiológico do volume de líquidos dentro dos tecidos).
Um dos mais conhecidos é o hormônio relaxina, que atua sobre músculos e ligamentos, favorecendo um amolecimento de cartilagens e relaxamento muscular global.
As alterações posturais na gestação decorrem geralmente da anteriorização do centro de gravidade, devido ao aumento do peso corporal, em especial na região anterior (aumento do volume do útero e das mamas).
Na gestação há o aumento da lordose lombar, com sobrecarga da musculatura dorsal. Algumas mulheres realizam uma compensação, com o aumento da cifose torácica e anteriorização da cabeça. Outra compensação para melhorar o equilíbrio da gestante é a ampliação da base de apoio dos pés durante a deambulação ou mesmo na postura ortostática.


Sabendo das principais mudanças que ocorrem com as gestantes e tendo a liberação médica para a prática da atividade física, as gestantes não só podem, como devem praticar atividades físicas, porém sempre bem orientadas por um profissional capacitado da área.
Assim podemos listar algumas atividades físicas que podem e que não podem ser praticadas por gestantes.

Exercícios recomendados:

São recomendados exercícios aeróbicos como a caminhada (evitar subidas e descidas muito íngremes), ciclismo (ergométrico) são ótimos para melhorar a circulação sangüínea e contribuem para a diminuição de riscos de problemas cardíacos.
A prática da musculação é bem recomendada para a gestante, o treinamento com pesos pode favorecer o fortalecimento muscular fazendo com que a grávida suporte melhor seu peso, melhore o centro de gravidade, tenha facilidade em realizar tarefas do dia a dia, melhore a postura e principalmente favorece a diminuição de lombalgias.

Atividades desfavoráveis:

Qualquer exercício físico de alto impacto ou esportes de contato físico e risco de trauma devem ser desaconselhados. Corrida, artes marciais, esportes coletivos e competitivos são ótimos exemplos que devem ser evitados.

A seguir, segue um vídeo de uma aluna gestante com um período de 20 semanas de gestação, praticando treinamento resistido (musculação).



Segundo esta aluna, o treinamento com pesos tem sido bastante gratificante.
Seu peso está aumentando apenas devido ao desenvolvimento do embrião, sua massa gorda não aumentou em momento algum, seu índice de massa corporal está dentro dos padrões determinados, considerado como normal, não houve retenção hídrica nos membros inferiores, não existem queixas de indisposição física nem mesmo de dores musculares, ao contrário, a prática regular da atividade física vem motivando-a e deixando-a cada vez mais disposta para o seu dia a dia.
Vale ressaltar também, que ela é acompanhada por uma nutricionista e uma obstetra que lhe avaliam em determinados intervalos de tempo.


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